segunda-feira, maio 29, 2006

Medo e Delírio em São Paulo (ou O Dia em que os Estranhos Tomaram a Cidade) pt.1

20/05/2006 - Era uma semana atípica em São Paulo. Na segunda-feira, dia 15, um pânico generalizado tomou conta da cidade. As ruas estavam caóticas, o trânsito estava insano e o clima de medo era geral. Ônibus eram queimados, delegacias eram metralhadas e bombas explodiam incessantemente, dizia a imprensa. Parece que nem as instituições de ensino foram poupadas dos ataques. Na internet, uma série de boatos pipocavam: "MACKENZIE FOI METRALHADA", "MÍSSIL ISRAELENSE EXPLODE NA FAAP", "UNINOVE É ATINGIDA POR TIROS DE FESTIM".

É natural que em momentos de pânico situações inusitadas aconteçam. A tradicional hora do rush foi antecipada para as quatro da tarde, numa sincronia que se assemelhava à Operação Descida, na Imigrantes. O comércio fechou as portas mais cedo e muitos cogitaram promover saques para fazer estoque de alimentos. Mas a imagem da Avenida Paulista totalmente vazia, como uma cidade fantasma do velho oeste (com direito a bolas de feno saltitando com o vento), evidenciou o estado calamitoso da cidade.

Só que, no fundo, as coisas continuavam iguais: os criminosos agiam livremente, os policiais matavam inocentes e as autoridades mentiam. Só que tudo isso numa quantidade muito maior e com o "apoio" de uma mídia extremamente inflamada - pra não dizer sensacionalista. Se fossemos levar em conta tudo o que a imprensa dizia, poderíamos esperar que, no instante em que colocássemos o pé fora de casa, tomaríamos rajadas de tiros de fuzil e ainda bateriam nossa carteira.

Porém, em três dias, a situação já tinha quase se normalizado. Por isso, mesmo com algumas divergências, era certo que iria rolar a 2ª Virada Cultural. Mesmo alheio, queria me deleitar com os atrativos deste evento, mesmo que para isso tivesse que entrar numa linha de tiro de uma Magnum 44. Quando uma fonte segura me indicou o show do cantor/performer Rogério Skylab, dei como certa minha incursão ao evento paulistano.

Na tarde de sábado, fui até o local do show, no Centro Cultural São Paulo, acompanhado de um amigo, que estava dividido entre dois eventos sócio-musicais. Baseado em uma fonte pseudo-segura, que assegurava a lotação máxima do local, tratei de chegar umas duas horas antes do show. Coloquei meu carro no estacionamento, que possuia uma inclinação de 75 graus, e segui a pé até o Centro Cultural.

Fomos até a bilheteria e constatei que algo estava muito errado por ali: a fila fora tomada por seres estranhos. Aliás, estranho é apelido. Parecia que éramos as primeiras pessoas do local que não tinham um penteado exótico - isso porque meu cabelo não é nada que se diga "meu deus, que cabelo lindo o Master tem". Além disso, o preto era padrão por essas bandas, como se todos estivessem indo a um baile no inferno. De fato, se Deus quisesse provocar um dilúvio, o primeiro lugar que Ele inundaria seria o Centro Cultural.

Mas Ele não quis, talvez por misericórdia. Pois neste mundo ingrato nada foi mais insuperável que o estranho da espadinha de plástico. Acompanhado por amigos que se vestiam uniformemente (calça jeans, camiseta preta de banda de black metal e mochila nas costas), o intrépido estranho não temia em, ocasionalmente, desembainhar sua espada de plástico e brandí-la, evidenciando o chocalho preso a sua empunhadura. Sua desenvoltura com tal armamento branco era total e nem os olhos vigilantes dos guardas reprimiam sua ação. Ele era praticamente um Musashi dos tempos modernos. Mas, infelizmente, acabei perdendo-o de vista após a distribuição dos ingressos.

Como se isso já não fosse demasiado bizarro, notei que havia uma clara inversão de papéis por ali. Enquanto que, em sociedades corretas e civilizadas, os normais se impõe sobre os estranhos, no Centro Cultural a lei que vigorava era a dos estranhos. Um típico caso de etnocentrismo crônico. Afinal, estávamos jogando em campo adversário, diria Pierre Bourdieu. E isso ficou evidente quando a atendente da bilheteria tratou me com um certo asco e quando o vendedor de bebidas se recusou a nos vender uma lata de cerveja. Por isso que Hunter S. Thompson já dizia: "Quando as coisas ficam estranhas, os estranhos viram profissionais".

É interessante ressaltar o cheiro de cultura que exalava no ambiente. No mínimo espaço livre, as pessoas dedicavam-se a dançar escancaradamente, sem qualquer medo do rídiculo. Inclusive, enquanto pegávamos a fila para entrar no show, uma banda de cordel estradeiro passeava pelos salões do Centro Cultural, agitando os transeuntes e congestionando o local. Continua...

quinta-feira, maio 18, 2006

A hora é agora (Ou o dia em que São Paulo parou)

Olá, leitores. Espero que estejam hoje visitando o E.E. de suas casas, da forma mais segura possível. Espero que tenham aberto mão da liberdade pela segurança, e espero que leiam esta reportagem escrita por um professor da faculdade de Comunicação Social que freqüento, pois ele deu liberdade para tal. Não vou citar nomes, e hoje esta decisão está indo além dos simples costumes do recinto. Caso haja interesse, enviem e-mail depois, pois quero deixar claro quem realmente merece os créditos do texto, que pode parecer tendencioso, mas prima em mostrar os dois lados da mesma moeda. Sem mais delongas, acompanhem o relato sobre as violentas ondas de ataque à São Paulo:

São Paulo, 15 de maio, fim de tarde.


Eu nunca tinha visto o Pezão tão animado. Otimista por natureza, ele circula pelo centro da cidade com desenvoltura, sempre entre dez da noite e cinco da manhã. Gosta de contar prosa, falar do PCC, que quem mexe com ele vai morrer, que ele vai arrebentar, que com ele não tem moleza. Pezão tem 11 anos.
Pezão não é um Falcão do MV Bill e não se encaixa no modo que a elite gosta de ver os meninos do crime. Ele não é um bandido arrependido que quer virar palhaço de circo. Na verdade, nem bandido é. Seu sonho é ser assaltante de banco, mas ainda não teve a chance... Afinal, Pezão tem 11 anos.
Não sei aonde ele dorme. Uma vez perguntei e ele me tirou: “ih, qualé meu, tá preocupado comigo?”. Foi foda. Errei. Quase perdi sua amizade. Mas me recuperei. Tratei-o de novo como homem: “ih, qualé, quero mais é que tu se foda!”. Aí ele gostou... Voltamos a falar animados dos grandes golpes do PCC, das maravilhosas ligações com o Comando Vermelho, de que ele tem um grande futuro, que vai mais é arrebentar!
Ao contrário dos Falcões, Pezão não é melodramático e não se julga vítima da sociedade. Vítima o caralho! Pezão é algoz! Pezão é o terror! Está no auge de sua vida, num momento cheio de esperanças diante da gloriosa vida criminal que um dia ele terá. Ele não vê a hora. Com a potência dos trágicos, Pezão quer agir!
Pezão está sempre pra cima. Mas nunca o vi tão animado quanto hoje, dia 15 de maio, às cinco da tarde. Em meio ao caos que dominava a cidade, em meio ao pânico generalizado, em meio a pessoas que queriam chegar seguras ao refúgio do lar, Pezão andava seguro pela Praça da República. Naquela tarde ele era superior a todos, andava feliz, peito para cima, ginga de malandro. Pezão era o único homem sem medo nas ruas de São Paulo. E Pezão tem só 11 anos. Ao ver-me perdeu o estilo de homem, voltou a ser moleque e veio saltitante pedir uma grana. “Hoje eu preciso, tenho que correr para a Favela da Maré, procurar meu irmão, que é do partido”. Eu já tinha ouvido falar desse irmão, Pezão só fala dele, não vê o cara há anos, mas ouve falar, diz que ele é quente, que acabou de sair da cadeia, que é profissional. Pezão quer ajudar, está pronto para o que der e vier. E a hora é agora! A partir de hoje playboy não vai mais ter vez. Pezão estava feliz. Muito feliz. Hoje é um grande dia. Eu dei três reais para ele... É pecado não dar docinho para criança.
No resto da cidade a boataria rolava solta. Os playboys se comunicam como podem, invadem a web e gastam fortunas em telefones celulares. Sabiam que a FAAP foi atacada? Lá é alvo prioritário. “ELES querem NOS pegar”. Depois foi o Mackenzie. Explodiu uma bomba lá. Tem um estudante ferido! Um estudante!!!
Nas ruas o medo une as pessoas. Todos conversam, trocam informações e atacam os bandidos. A guerra começou. Pinheiros parou total. Todas as lojas fecharam. Há ônibus queimados por toda a cidade. O governo decretou toque de recolher. Às 20 horas todos devem estar em casa. O exército vai sair às ruas 21 h. Serão 4 mil homens e eles vão caçar os bandidos! Eles vão arrebentar. Aí eu quero ver!!!

Sabe que esse caos até que é bom!!! Isso tinha que acontecer um dia!! Agora os lados se definem. Agora a guerra começa!

O taxista Joaquim fala pouco e fala sério. É um quarentão gordo e forte. Conta com orgulho que fez oito anos de exército. Seus cabelos grisalhos são cortados reco, estilo Tiro de Guerra. É um homem disciplinado. “Eu fui treinado para matar!”. Acha que tem mais é que endurecer, enfrentar os bandidos.
Eu concordava com tudo. Disse que o certo era matar o tal de Marcola, isso poderia acabar com o comando do crime. Ele discordou e me surpreendeu: “será que Joaquim é humanista e contra o extermínio de presos?”. Mas ele esclareceu, falando devagar e com ódio crescente: “Não tem que matar o Marcola. Tem que matar a mãe dele. E picotar o corpo todo, trazer os pedacinhos para ele ver”.
Bem que eu tentei, mas dessa vez não consegui fingir concordância. Fiquei meio surpreso. Ele percebeu e gostou! Sentiu prazer em me chocar, em mostrar que ele é o mais forte. Afinal, Joaquim foi treinado para matar! Ele me explicou que em qualquer guerra sempre terá vítimas inocentes. É uma conseqüência do combate.
Comentei também do exército. Sugeri que o governo deveria armar também civis, dar licença para matar. Joaquim discordou. Não é certo armar a todos, pois o povo não está preparado. O exército deveria armar apenas os que têm treinamento militar. Como ele! “Chegou a MINHA hora!”
Nunca, nos últimos anos, a auto-estima de Joaquim foi tão alta. Eu perguntei se ele, como todos na cidade, iria para casa após a minha corrida. Ele disse, enigmático, que pretendia trabalhar a noite. Afinal, a hora é agora. Chega dessa vida pequena de taxista, chega desse cotidiano de trânsito, chega de Faustão aos domingos, chega de filhos chatos e esposa obesa. Chegou a hora de agir e Joaquim a enfrentava com o prazer tranqüilo de Charles Bronson em Desejo de Matar.
A noite avança e o país está dividido. Enquanto os líderes políticos das duas quadrilhas brasileiras - a quadrilha ilegal do PCC e a quadrilha legal dos Políticos - se reúnem para chegar a um acordo que contenha a guerra civil e mantenha eternamente seus privilégios, as bases de ambos os lados se preparam para matar. Pezão, 11 anos, camisa para fora da calça, anda pelas ruas procurando contribuir em algum atentado, qualquer que seja. Já o quarentão Joaquim deixou a esposa preocupada e a janta esfriando sobre a mesa. Ele circula sozinho em seu táxi, com o braço esticado no volante e um revólver no meio das pernas. Joaquim está ansioso para ter um motivo, qualquer motivo, para atacar. Afinal: ele foi treinado para matar. Ambos, Pezão e Joaquim, estão felizes. A tensão e o ódio que eles acumularam em anos terá finalmente um lugar para escoar. A guerra vai começar! A hora é agora!

quarta-feira, maio 10, 2006

O que fiz pelo quefazer

Oasis, Cigarrets & Alcohol (adaptado) - "Is it my imagination, or have I finally found something worth working for?"
04/05/06 – Recebo o e-mail... “Vi o seu curriculum. Você não pode me falar um pouco sobre você, seu gosto musical?...”.

30 minutos depois – “Você topa fazer uma entrevista amanhã? 11:30. Av. Prof. Alfonso Bovero, 52, 5o andar”.

Parecia mais uma quinta-feira serena. Eu me armava para ir p’ra faculdade enquanto ouvia Frank Muller lendo 1984 no computador (estava com preguiça de fazer eu mesmo), e contabilizava mais um dia desempregado. Isso até eu ler o que foi transcrito brevemente no parágrafo acima na minha caixa de e-mails. A MINHA, de todas as que existem no orbe.

Seria só mais uma entrevista de emprego, como muitos devem presumir (erroneamente), não fosse o fato de o endereço dado não ser nenhum outro senão o da MTV Brasil. E caso presumam que eu fiquei embevecido com a situação, bem... Erraram novamente. O clima ia muito além. Deixando de lado os fatores que fazem da MTV o que ela é, precisei fundamentalmente levar em consideração a importância da música no que diz respeito aos vínculos de amizade que fortaleci e criei para moldar a acuidade do momento. Já havia feito duas “dinâmicas” para tentar um estágio no SBT, e a sensação não chegou nem perto.

Mas, enfim, fui para a aula. Não fiquei muito tempo. Só o suficiente para ter idéia de como continuar uma monografia que preciso preparar até o fim do ano letivo (As próximas quintas serão maçantes). Tão logo estava em casa liguei a TV para ver aquele time corintiano sendo apoucado novamente por argentinos enquanto a massa ficava realmente furiosa com a situação. Não consegui evitar um sorriso largo, apesar de dá-lo em vão, uma vez que estava sozinho... Talvez não tão em vão, afinal, o prazer solitário existe. Fui dormir.

A sexta-feira amanheceu agradável em São Paulo, ensolarada e com a temperatura na casa dos 18o. Aquele céu acinzentado era o mais azul que iríamos conseguir, por mais que bramíssemos. Acordei, fui ao banheiro, tirei a roupa, tomei banho e percebi agora que não preciso mencionar esses pormenores. Então vou para o ponto de ônibus. O que vai me levar lá é o 478-P, e como somos bem representados politicamente, meu interesse em que o ônibus passasse logo não foi atendido. Por falar em interesses políticos, vou deixar um link para o código de conduta eleitoral democrática segundo um grande amigo meu AQUI.

Voltando ao ônibus, ou melhor, já saindo dele (porque, francamente, ninguém merece...), estava adiantado em cerca de 2 horas (sou precavido e necessitado quando a questão é emprego), e parei para tomar um café na padaria que fica ao lado da sede da MTV. Lá era legal. Além de dois caras que bebiam chopp às nove e meia da manhã, apareceram para o boquejo matinal ninguém menos que Gil Brother, também conhecido como Auê, e Boça. Aquilo era pitoresco demais!

Depois de enrolar um pouco na panificadora fui na frente do prédio da MTV, fiquei parado lá. Naquela hora bateu um nervoso excelso. Não sei exatamente porque. Estava mais bonançoso que lagoa poluída no Rio chamando dengue com a entrevista. Mas acho que o que abala mesmo é ver aquela instituição na sua frente. E não só isso, mas ver também toda a história que aquele espaço físico reservou para a televisão, começando pelas mãos do Chateaubriand com a TV Tupi. Tentei relaxar. Por sorte o elenco do Hermes e Renato formava uma roda e batiam bola na calçada em frente ao prédio e também na rua, quando não passavam carros (ou quando alguns passavam também). Consegui me distrair um pouco, mas não entrei no prédio. A idéia de passar na frente do H&R faz você pensar que vai ser sacaneado a qualquer custo, e eu não precisava daquilo. Esperei que eles fossem embora para fazer algumas gravações externas (como eu disse, o dia estava bonito).

Quando entrei recebi um cartão de visitante, esperei no saguão e na hora em que o relógio do meu celular se aproximou das 11:30 fui chamado para fazer a entrevista. Porém, a sensação de estar esperando no saguão ansiosamente não passou...

quinta-feira, maio 04, 2006

"A melhor safra do Rock n' Roll"

É muito fácil ser fã de uma banda. É mais fácil ainda ser fã de um movimento, e o difícil (nesse caso) é ser fã de uma banda que representa um movimento composto por várias bandas. Mas eu conheço (e sou fã) de uma banda dessas.

Antes de começar este relato quero deixar claro que o que vou depor aqui não é jabá. Jabá, para quem ainda não se familiarizou com os termos peculiares dos veículos de comunicação, é o famoso e (im)popular “qué (sic) pagá (sic) quanto?” (sic significa escrever errado de propósito). O jabá é a famigerada propaganda... Quem paga mais é anunciado... mas não vou entrar nos detalhes e só queria deixar claro que este levantamento é o de um fã, e não o de um vendido.

Eu admiro os anos 60, que é o movimento em questão, e nos tempos áureos de 2004 conheci a banda de (só podia) rock n’ roll Vintage Box, que possui o melhor repertório dessa década de ouro (talvez mais dourado no sentido musical que no histórico, sendo que o primeiro embalou e deu vários problemas pro segundo via questionamento de direitos humanos).

"Mas tocar covers clássicos é fácil, Fuser!" é o que me dizem. Realmente, músicas que ficam ternizadas são as mais tocadas... causa e conseqüência... “TOCA RAÚL”... isso tudo é verdade, mas na hora da presença de palco a V. B. coloca essas “bandas tributo”no chinelo.

E já que estamos falando em palco, e voltando para 2004, a primeira vez que os ouvi foi num (só podia) bar-boteco que nem palco tinha. E nem mesa tinha no bar, porque as sextas-feiras eram tão quentes com a Vintage Box que as pessoas invadiam as ruas da esquina da Lacerda com a Basílio. De repente aquilo virou um rito, e quando eu não ia nesse bar (Aclimação Bar & Chopperia) às sextas era porque eles não iam tocar lá ou porque pintava uma daquelas festas horrorshow no pombal. Mas esse tipo de festa era facilmente transferido para os sábados, e a banda tinha que dividir as atenções com outros públicos, como Campinas, Alfenas e Vinhedo.

Antes de fechar o ano o PSIU (órgão regulador da baderna sonora) fechou as portas da Vintage no Aclimação, e eu (ou melhor) e nós (porque eu tive que mostrar a sensação pros camaradas) ficamos órfãos da boa música e do bom humor. Fim de história, aquele bar nunca mais foi o mesmo (e isso não é o tipo de coisa que te impede de continuar indo no bar), e com uma certa freqüência ainda era possível ouvir um bom blues em baixo som. Cult, mas não é rock!O último gathering deles lá na Lacerda foi em 2005 (estilo Beatles no telhado, tirando a parte do telhado). Novembro. Nunca mais outra vez...

...Isso até sábado do dia 15 de abril, 2006. Não me contive, fui num bar/arqueria em Moema, onde atualmente a banda se apresenta mensalmente. Véspera de Páscoa e a ressurreição acontecendo na minha frente. Isso porque o Fabito (bateria) lembrava de mim nos tempos de Aclimação; o Siri (baixo) estava no melhor estilo Reginaldo Rossi; o César (base/vocal) fazia anos no exato dia e o Perna (vocal/solo)... ah, o Perna (solo/vocal) estava muito alcoolizado.

Foi uma noite inesquecível e um show de arregaçar que contou com o melhor do Rock internacional dos anos 60 e a MPB da década idem. É aquele negócio... presença de palco é tudo... O Perna afirmava a cada intervalo de três músicas que foi eleito o homem mais bonito do Brasil (e mostrando um medalhão que comprova o prêmio), deixando na condição de vice o lendário Sidnei Magal himself. Além disso afirma a condição de chifrudo em todo show, e leva na bagagem justificativas como: “Melhor comer doce com dez que comer merda sozinho”. Não se espera mais de quem declara seu estado civil como: "Corno apaixonado".

Depois de se abrir ao público, a banda faz uma saideira do mesmo naipe, cantando “Garçom”, e no meio de tanta seriedade na música e brincadeira na apresentação a Vintage Box eterniza mais um show. Mais um que estive presente com prazer, e pude ver a banda fazer carnaval fora de época. Fora de época 40 anos depois.

segunda-feira, maio 01, 2006

Vamos Agora Louvar os Famosos Duendes da Morte

Lester Bangs possuia uma imagem nefasta, daquelas que valeria a pena atravessar a rua só para não cruzar o seu caminho. Seu cabelo desgrenhado e seu vasto bigode à la Hell's Angels faziam-no parecer ter saído de um filme B dos anos 70. Além disso, tinha o hábito de se vestir como um dono de uma loja de discos underground do centro decrépito de alguma cidade da Califórnia - se já viste Alta Fidelidade, talvez saiba do que estou falando.

Mas bizarrices à parte, Lester é até hoje reverenciado como um dos maiores críticos musicais que o mundo já viu. Tanto que recebeu homenagens de duas majestosas bandas: REM (em "It's the End of The World") e os Ramones (na canção, "It's Not My Place"). Também obteve uma menção honrosa no filme "Quase Famosos", de Cameron Crowe, no qual Philip Seymour "Capote" Hoffman teve o privilégio de interpretar Bangs.

E o que Lester tinha de especial? Difícil dizer. Ele não era o mais brilhante, nem tinha o gosto mais refinado (até aí, nenhum crítico tem), tampouco era rebuscado. Mas Lester escrevia com a alma e não temia voltar atrás quando errava. Tirar sarro dos músicos e de sua própria profissão era outra máxima de Bangs. Por isso preferia enfrentar a fila, junto à gentalha, do que pertencer ao mundo VIP das tribunas de imprensa. Sua idéia de música era democrática e comunitária e não restrita a uma oligarquia. Por isso que também repudiava o estrelato: "um rockstar é apenas uma pessoa".

Não é à toa que ele foi considerado um "maldito" - a classe dos escritores marginalizados, cujo niilismo encontra-se num grau incomensurável. Escrever desregradamente e com doses de álcool e anfetamina no cérebro é outra característica dos "malditos", a exemplo de Charles Bukowski e Hunter S. Thompson. De fato, Lester tinha tudo pra entrar nesse rol: era instrasigente em suas opiniões, dava vazão aos sentimentos e era um adepto do new journalism, mas que poderia muito bem se considerar um filho bastardo do jornalismo gonzo.

Só que Bangs não tinha a vivacidade de Thompson, nem era um cronista do submundo como Bukowski - e nem poderia ser diferente. Mas Lester resolveu fazer mais pelo rock do que qualquer outro. Definiu os termos de Heavy Metal e Punk Rock, quando estes surgiram no começo dos anos 70; acompanhou o começo do fenômeno da música eletrônica, com Kraftwerk; destruiu o ego exarcebado de Lou Reed e desceu o pau em Elvis Presley em pleno mês de sua morte, chegando a compará-lo ao Pentágono: "[...] uma gigantesca instituição blindada da qual ninguém sabe nada a respeito exceto que seu poder é lendário."

Lester Bangs começou como freelancer na Rolling Stones, em 1969. Fez colaborações até 1973 quando foi mandado embora por ser "desrespeitoso com músicos". Teve publicações também na Village Voice, na Playboy e NME, mas fez sucesso mesmo na revista Creem. Com liberdade editorial, Bangs começou a traçar seu estilo e, desde então, passou definir a maneira de escrever sobre o rock. Morreu em 1982, aos 34 anos, numa overdose de medicamentos contra o alcoolismo, mal que combatia desde o fim dos anos 70.

Diante disso, é interessante perguntar: se em 12 anos ele revolucionou a maneira de ouvir e de escrever sobre música, o que Bangs não faria se ainda estivesse vivo? O que ele diria sobre a emersão do grunge e do suicídio de Kurt Cobain? Ou do Oasis e seu ego megalomaníaco? O que diria da possível volta do Pink Floyd? E da revolução da música digital e do Ipod? E de Maddona e Britney Spears? E do New Metal ou da onda Emo? E do The Strokes, a "salvação" do Rock? Infelizmente, Bangs perdeu muita coisa. E nós também.