Medo e Delírio em São Paulo (ou Muito Além do Plano 9) pt.3
Pois bem, após o show fomos bater um rango no McInfâmia, onde também decidimos nosso segundo destino: a Cinemateca Brasileira. Com o grande atrativo de ser perto e gratuito, o local também teria uma atração solene. De acordo com os prognósticos, lá passaria uma sessão chamada "Malditos Filmes Brasileiros", e se meu conhecimento de cinema nacional não falha, isso seria ou muito ruim ou muito bom.
O lugar realmente impressiona. Mesmo com cara de velho, possivelmente era uma antiga fábrica de alguma coisa do século passado, a Cinemateca tinha um quê de tecnocult. Um lounge aconchegante serve como ante-sala a uma das sessões de cinema. No fundo, há um terreno aberto, onde encontrava-se um telão e algumas cadeiras. Lounge, cinema ao ar livre e banheiro bonito. Se isso não é cult, os pós-modernistas podem chiar o quanto quiserem.
Aliás, moderno é tudo o que o primeiro filme maldito não tinha. Entitulado O Último Cão de Guerra, o longa contava a história de um ditador adepto do neo-nazismo que quer criar uma raça perfeita. Para tal, ele rapta todas as jovens do país (cujo nome não é mencionado) que possuem um Q.I. elevado - ou quase isso. Junto com seus capangas facínoras, ele prende as damas em um campo de concentração e as submetem aos mais perversos serviços sexuais. Indignados, parentes das raparigas contratam mercenários para resgatá-las, incluindo Jô (Tony Vieira, que é o diretor do filme), um veterano no Vietnã sedento por vingança.
A estética do filme é completamente marginal, resquício do cinema da década de 70 - só que elevado a enésima potência. O roteiro é confuso, as atuações são péssimas e tudo acaba em putaria. Se você está familiarizado com o termo cinema da Boca do Lixo, talvez a experiência de assistir esse filme não seja tão ruim assim. Na verdade, chega até a ser bom. Certos diálogos são totalmente impagáveis, principalmente por sua espontaneidade, e, com certo esforço, os cenários chegam a ser verossímeis com a história. Esse sim é o legítimo neo-realismo brasileiro.
Só que mesmo o roteiro sendo simples, os caras conseguiram deixá-lo com mais furos do que queijo suíço. Como afinal esse ditador chegou ao poder? Voto popular, golpe de estado articulado pela CIA, revolução armada? Essa película simplesmente não explica - ou talvez explique, só que é tão confuso que eu não percebi. Também tem o cara que fica o tempo todo enjaulado e sendo torturado por um guarda negão. Até que chega uma hora em que o guarda tenta fornicar com o cara, que mata o negão na faca, é descoberto e morre. Tão esdrúxulo que poderia ter ficado de fora.
Isso sem falar que este é um dos longas com mais homícidios da história do cinema nacional. Para se ter uma idéia, de 4 mercenários, apenas 2 sobreviveram. Assim como as moças resgatadas, o qual sobrou somente uma pra contar a (tosca) história. Outro absurdo é o número de granadas no campo de batalha. A quantidade de explosivos arremessados poderiam encher uma mochila de acampamento inteira, sem contar que nenhuma erra o alvo ou deixa de causar danos ao inimigo.
Apesar disso tudo e tirando a música-tema, que é tocada em qualquer ocasião, o filme não é de todo ruim. Se tivesse uma direção mais apurada, um roteiro melhor construído, atuações mais realistas e um orçamento maior, talvez O Último Cão de Guerra conseguisse virar um top da pornochanchada - o que não quer dizer muita coisa. Mas garanto que este é bem melhor que o segundo filme maldito, um pseudo-suspense chamado O Castelo das Taras e que tinha mais porno do que chanchada.
Mas apesar de termos abandonados o barco antes deste segundo filme acabar, havia mais diversão grátis na noite. Seguimos até o Museu do Ipiranga a fim de acompanhar o show de Moraes Moreira. Chegamos lá num piscar, e descobri de forma triste que a região do Ipiranga é a que mais tem valetas assassinas em todo o mundo. Já não fosse ruim o bastante, quando fui estacionar, um meliante tentou nos extorquir. Disse que iria olhar o carro, mas eu não queria que ele fizesse o serviço. Mas se eu fosse explicar isso, é certo que sairia gente do esgoto para me fazer mudar de idéia.
Por isso, dei um migué e fomos falar com as autoridades policiais. Demos uma de X-9 e caguetamos o vacilão. Daí pra frente, a gente ficou tranquilo. Achávamos que os guardas iriam dar um enquadro no elemento suspeito e autuar-o-iam no artigo 171 do código penal. Por isso seguimos até o Monumento.
Havia um forte clima de segurança no local. Um enorme contigente de policiais foram deslocados para o Museu, talvez esperando algum atentado a bomba, plantada em um dos banheiros químicos públicos. Mesmo assim e apesar do frio, a música de festa junina de Moreira conseguiu empolgar muitos espectadores, enquanto outros pareciam repudiar a cultura folk-brasileira.
Como chegamos tarde, o show durou menos de meia hora e, então decidimos encerrar a noite ali. Passamos pelas barraquinhas de quitutes e de pequenices e seguimos até o carro. Dei uma espiadela e vi que o bandido ainda andava solto e teve a desfaçatez de cobrar por seus serviços. Já que a justiça dos homens não funcionou, eu tinha que fazer minha própria justiça. Entrei no carro, engatei a primeira, soltei o freio de mão, liguei o motor e sai voando, deixando o maldito a ver navios. Ah.. nada como as aulas de direção ofensiva que a vida nos ensina.
O lugar realmente impressiona. Mesmo com cara de velho, possivelmente era uma antiga fábrica de alguma coisa do século passado, a Cinemateca tinha um quê de tecnocult. Um lounge aconchegante serve como ante-sala a uma das sessões de cinema. No fundo, há um terreno aberto, onde encontrava-se um telão e algumas cadeiras. Lounge, cinema ao ar livre e banheiro bonito. Se isso não é cult, os pós-modernistas podem chiar o quanto quiserem.
Aliás, moderno é tudo o que o primeiro filme maldito não tinha. Entitulado O Último Cão de Guerra, o longa contava a história de um ditador adepto do neo-nazismo que quer criar uma raça perfeita. Para tal, ele rapta todas as jovens do país (cujo nome não é mencionado) que possuem um Q.I. elevado - ou quase isso. Junto com seus capangas facínoras, ele prende as damas em um campo de concentração e as submetem aos mais perversos serviços sexuais. Indignados, parentes das raparigas contratam mercenários para resgatá-las, incluindo Jô (Tony Vieira, que é o diretor do filme), um veterano no Vietnã sedento por vingança.
A estética do filme é completamente marginal, resquício do cinema da década de 70 - só que elevado a enésima potência. O roteiro é confuso, as atuações são péssimas e tudo acaba em putaria. Se você está familiarizado com o termo cinema da Boca do Lixo, talvez a experiência de assistir esse filme não seja tão ruim assim. Na verdade, chega até a ser bom. Certos diálogos são totalmente impagáveis, principalmente por sua espontaneidade, e, com certo esforço, os cenários chegam a ser verossímeis com a história. Esse sim é o legítimo neo-realismo brasileiro.
Só que mesmo o roteiro sendo simples, os caras conseguiram deixá-lo com mais furos do que queijo suíço. Como afinal esse ditador chegou ao poder? Voto popular, golpe de estado articulado pela CIA, revolução armada? Essa película simplesmente não explica - ou talvez explique, só que é tão confuso que eu não percebi. Também tem o cara que fica o tempo todo enjaulado e sendo torturado por um guarda negão. Até que chega uma hora em que o guarda tenta fornicar com o cara, que mata o negão na faca, é descoberto e morre. Tão esdrúxulo que poderia ter ficado de fora.
Isso sem falar que este é um dos longas com mais homícidios da história do cinema nacional. Para se ter uma idéia, de 4 mercenários, apenas 2 sobreviveram. Assim como as moças resgatadas, o qual sobrou somente uma pra contar a (tosca) história. Outro absurdo é o número de granadas no campo de batalha. A quantidade de explosivos arremessados poderiam encher uma mochila de acampamento inteira, sem contar que nenhuma erra o alvo ou deixa de causar danos ao inimigo.
Apesar disso tudo e tirando a música-tema, que é tocada em qualquer ocasião, o filme não é de todo ruim. Se tivesse uma direção mais apurada, um roteiro melhor construído, atuações mais realistas e um orçamento maior, talvez O Último Cão de Guerra conseguisse virar um top da pornochanchada - o que não quer dizer muita coisa. Mas garanto que este é bem melhor que o segundo filme maldito, um pseudo-suspense chamado O Castelo das Taras e que tinha mais porno do que chanchada.
Mas apesar de termos abandonados o barco antes deste segundo filme acabar, havia mais diversão grátis na noite. Seguimos até o Museu do Ipiranga a fim de acompanhar o show de Moraes Moreira. Chegamos lá num piscar, e descobri de forma triste que a região do Ipiranga é a que mais tem valetas assassinas em todo o mundo. Já não fosse ruim o bastante, quando fui estacionar, um meliante tentou nos extorquir. Disse que iria olhar o carro, mas eu não queria que ele fizesse o serviço. Mas se eu fosse explicar isso, é certo que sairia gente do esgoto para me fazer mudar de idéia.
Por isso, dei um migué e fomos falar com as autoridades policiais. Demos uma de X-9 e caguetamos o vacilão. Daí pra frente, a gente ficou tranquilo. Achávamos que os guardas iriam dar um enquadro no elemento suspeito e autuar-o-iam no artigo 171 do código penal. Por isso seguimos até o Monumento.
Havia um forte clima de segurança no local. Um enorme contigente de policiais foram deslocados para o Museu, talvez esperando algum atentado a bomba, plantada em um dos banheiros químicos públicos. Mesmo assim e apesar do frio, a música de festa junina de Moreira conseguiu empolgar muitos espectadores, enquanto outros pareciam repudiar a cultura folk-brasileira.
Como chegamos tarde, o show durou menos de meia hora e, então decidimos encerrar a noite ali. Passamos pelas barraquinhas de quitutes e de pequenices e seguimos até o carro. Dei uma espiadela e vi que o bandido ainda andava solto e teve a desfaçatez de cobrar por seus serviços. Já que a justiça dos homens não funcionou, eu tinha que fazer minha própria justiça. Entrei no carro, engatei a primeira, soltei o freio de mão, liguei o motor e sai voando, deixando o maldito a ver navios. Ah.. nada como as aulas de direção ofensiva que a vida nos ensina.
1 Comments:
Master, num erro de cálculo perdi a oportunidade de ao menos auxiliar na reconstituição dessa 3ª parte. Mas aqui está a maneira como havia começado a escrever, e vou postar, sim, no comentário, para que fique evidenciado o ato repressor.
Medo e delírio em São Paulo pt.3 (ou "Não era um filme Noir no ar")
Um momento antes de começar.
Toda história formada por uma trindade de capítulos em algum momento, não sendo na primeira parte, rememora o que de mais marcante aconteceu.
Então estávamos lá, no Centro Cultural Vergueiro, nos introduzindo ao mundo subversivo da Virada Cultural. Estávamos realmente entrando de cabeça no espírito da coisa, sem contanto repelir nosso olhar crítico e etnocêntrico. Portanto o headbanger hindu era bizarro tal qual a concepção bizarra em que todos naquele local se encaixavam.
Acredito ter citado o principal. Agora sim: "Não era um filme Noir no ar".
Quando disse que embarcamos no âmago da Virada não estava brincando. Passamos a procurar por novas apresentações culturais gratuitas, decididos que por sim ou não o show de Skylab seria somente um preâmbulo de uma longa e proveitosa noite, free of charge, é claro. Afinal, comunicadores são alérgicos a dinheiro.
A Cinemateca Brasileira oferecia três sessões instigantes. “Planeta Futebol” tratava de uma coleção de fotografias do mundo (e) da bola e a “Noite da Revolução”, uma seleção de filmes sobre revoluções da história. Apesar de chegarmos lá despretensiosos, a terceira atração reluzia em nossos olhos, de tão cultural que era. A “II Maratona Malditos Filmes Brasileiros”. Nada mais que um punhado de filmes cujos roteiros eram cheios de motivos para donzelas se despirem de fronte à câmera. Não somente a Cinemateca exibiria chanchadas da década de 80 como o faria ao ar livre.
Projeto ousado tal qual era, a II Maratona combinava sua exuberante apresentação “O último cão de guerra” (Tony Vieira) com todo o surrealismo arquitetônico que existe naquele local (inclusive nos banheiros com mictórios imperceptíveis e nas escadas que sobem ao andar sem piso) em uma química que, misturada ao O² de São Paulo, tornava o espetáculo singular. Era algo que valia boas risadas e ótimos aprofundamentos.
Para não deixar batido, o filme é sobre um general neonazista que, em seu campo de concentração, pretende criar uma raça superior fazendo experimentos com filhas de fazendeiros da região. Para salvarem suas filhas, os fazendeiros contratam um veterano do Vietnã. Enfim, isso é o que diz a sinopse fornecida pelos organizadores do evento, mas qualquer história serve de pano de fundo para mostrar jovens nuas e diálogos hilários. Qualquer história mesmo, como exemplo à do filme que viria em seguida: “Alunas de psicologia são levadas por professora a um castelo isolado onde devem fazer pesquisas. Ao chegarem, porém, a mestra se revela uma sacerdotisa do mal e invoca o espírito do Marques de Sade para tiranizar as pupilas”.
Não ficamos para assistir “O castelo das taras”.
Preciso deixar claro que parei por aqui pois me entristeci pela falta de timing.
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