domingo, junho 04, 2006

Medo e Delírio em São Paulo (ou "Eu tô Pensando") pt.2

"Nome: Clarisse
Altura: 1,80m
Esguia, magérrima, olhos de esfinge,
pés pequenininhos,
mas tem uma trolha!!!"

Carrocinha de Cachorro-Quente - Rogério Skylab


De fato, era esse tipo de poesia experimental pós-moderna que procurávamos naquele instante. Não precisávamos beber da mesma pseudo-realidade que esses estranhos bebiam. A realidade nua e crua, batida no liquidificador e tomada numa bota de cetim não era, nem de longe, um fardo para nós. E mesmo que fosse, não sei se me sujeitaria a seguir o estilo torpe desses seres exóticos. Darei um exemplo simples, porém emblemático:

Enquanto pegávamos a fila para entrar no concerto, uma estranha figura me chamou a atenção: uma mistura bizarra de metaleiro com algo que se assemelha a um hindu. De fato, essa eclética mistura deixaria Darwin pasmo. Mas eu achava que ele, assim como todos os estranhos do lugar, eram inofensivos. Achava que ser estranho já seria suficiente para eles. Ledo engano. Suas atitudes em nada lembravam a de um comportamente dito normal e sensato. Ah.. essa minha inocência.

Pois bem, o impacto do metaleiro hindu foi forte, mas eu já tinha perdido-o de vista. Por isso, eu pensava que, graças ao bom Deus, nunca mais veria tal figura novamente. Até que eu entro no local do show e assento-me de modo que minha visão do palco é a de cima pra baixo, tal qual nas tribunas de um teatro renascentista. Tinha uma vista privilegiada da situação, portanto dificilmente algo escaparia de meus olhos.

Assim, eu vejo um burburinho e um tumulto deveras chato lá na parte de baixo, onde os proletariados ficavam. E eis que me deparo novamente com o headbanger hindu, desta vez metido naquele celeuma vergonhoso. De fato, isso mostra que se na teoria eles eram estranhos, na prática eles também eram. Os gritos estridentes de seus amigos e a agitação inoportuna que promoviam, no qual se atiravam uns contra os outros, importunariam qualquer alma com senso de decência. "Seria patético, se não fosse pateta", diria o poeta. Mas por sorte, o show de Skylab® já estava pra começar.

Primeiro, entrou a banda, composta de um baterista, um guitarrista, um baixista e um violeiro. Eles começaram a tocar um som qualquer, até que - do completo submundo - surge Rogério Skylab. Lógico que ele não entraria no palco de forma normal, isso seria subestimar sua inteligência. Por isso, o cantor/performer passou reto, como se o assunto não fosse com ele, e sumiu na escuridão. Até que na sua segunda aparição, ele não resistiu e abocanhou o microfone, lançando gritos guturais e perguntando: "Tem certeza que você não quer anestesia?".

A platéia foi à loucura - e às risadas também, afinal estávamos ali pra isso. Trajando uma jaqueta azul estilo tactel, calça jeans, tênis de corrida e uma camiseta preta, o introspectivo Skylab® entregava-se a cada canção, testando as reações do público e esfacelando-se diante da platéia. Incrível como o cara acabou todo destroçado no final do show. Mas um negócio interessante que eu notei foi que, antes de cada música, ele pegava uma toalhinha e colocava sobre o rosto, como quem está se enxugando. Mas dizem as más linguas que na verdade a tal toalha fora embebida em éter, que tem função anestésica e psicotrópica, e Skylab® cheirou-o até não dar mais. Mas provavelmente isso deve ser lenda.

Como ir a um show de Rogério Skylab é uma experiência única e de dificil descrição (e compreensão), não irei me estender. Mas numa análise fria, eu penso que nesse show faltou alguns hits clássicos, como "Derrame", "Chico Xavier E Roberto Carlos", "O Meu Pau Fica Duro" e "22x2=43". Faço uma crítica também ao público do local, que não temia em cantar junto, bater palmas e pedir para tocar determinada música. Esse tipo de atitude soaria bem num show do Chico Rey e Paraná, mas no show do intransigente Skylab® isso soa ridículo. Continua...